Olimpíadas na era moderna
A
CONQUISTA DA GRÉCIA
Primeira
edição dos Jogos Olímpicos modernos toma Atenas
de assalto, coroa esforços dos organizadores, exibe extraordinárias proezas esportivas e renova a auto-estima dos helênicos
de assalto, coroa esforços dos organizadores, exibe extraordinárias proezas esportivas e renova a auto-estima dos helênicos
O Renascimento da festa dos esportes: o gregos e seus convidados participam da cerimônia de abertura, no último dia 6. |
Há
pouco mais de 15 séculos, no ano de 393, o imperador bizantino
Teodósio I, o Grande, varria do mapa a maior competição atlética
do planeta, os Jogos Olímpicos. Celebrados desde 776 a.C. às
margens do rio Alfeu e dedicados aos deuses gregos, os Jogos, que
congregavam cidadãos dos diversos estados do mundo helênico,
entraram na temida lista de "cultos pagãos" e tiveram sua
realização sumariamente proibida pelo soberano cristão. O infausto
decreto foi apenas mais uma das estocadas forasteiras no destino
livre da Grécia, berço da civilização e da cultura ocidental.
Assolada por guerras, desvirtuada por invasores, molestada por
celerados, a nação de Aristóteles, Sócrates e Platão só se
desgarraria do jugo estrangeiro neste século, quando a Guerra de
Independência de 1821 libertou a Grécia do Império Otomano. Com a
liberdade, porém, veio o desafio de recuperar um país quebrado e
desmoralizado pela milenar submissão tarefa hercúlea, como os
gregos vêm dolorosamente percebendo ao longo das últimas décadas.
A emocionante prova dos 100 metros rasos: disputa pacífica entre nações. |
Uma
luz, contudo, fez-se notar na escuridão dessa caverna de incertezas
neste mês de abril. O fogo que flamejava no altar de Héstia, na
Olímpia da Antiguidade, voltou a se acender em uma procissão de
tochas no centro de Atenas, celebrando o renascimento dos Jogos
Olímpicos, agora internacionais, realizados entre os dias 6 e 15 (25
de março a 3 de abril, pelo calendário juliano adotado pelos
gregos). O resgate do evento que reunia a flor da civilização
helênica em seu ápice não poderia ter chegado em melhor hora para
a nação de seus descendentes, ávida por um renascimento. Agora com
as portas abertas para o mundo, a Grécia, superando as desconfianças
e os problemas iniciais, logrou realizar um evento acolhedor e
brilhante, celebrado por atletas e visitantes, dentro do mais ilibado
espírito olímpico. Com isso, o país ganha não só uma injeção
de auto-estima, como também um voto de credibilidade aos olhos da
comunidade internacional presente aos Jogos.
Helênicos
na bancarrota
Vikelas, do comitê: em menos de 2 anos. |
Curiosamente,
partiu de um estrangeiro, o Barão de Coubertin, a centelha que
resultou na ressurreição dos Jogos. O desejo expressado pelo
francês eleito secretário-geral do recém-fundado Comitê
Olímpico Internacional, no Congresso de Paris, em 1894 era de que
a primeira edição acontecesse em 1900. Mas o grego Demetrius
Vikelas, presidente do comitê, sugeriu e bancou a realização dos
Jogos em 1896 um prazo, portanto, inferior a dois anos. A idéia
foi recebida de braços abertos pelos helênicos. Havia apenas um
empecilho, mas de proporções monumentais: o governo da Grécia
declarara estado de bancarrota em 1893. Como devedor de primeira
grandeza dos países europeus, não poderia entregar um dracma sequer
para o financiamento do evento, que já se avizinhava (o dracma,
moeda local, vale pouco mais de dez centavos de dólar americano).
Mas o rei Jorge, ciente de que a empreitada era de importância
nacional, organizou, com auxílio de Vikelas, um comitê provisório
para organização dos Jogos Olímpicos de Atenas. Era o primeiro
obstáculo a ser superado pelos gregos.
Jorge, o monarca: "Vida longa à Grécia". |
O
colegiado era encabeçado pelo príncipe herdeiro Constantino, tendo
como principais auxiliares seus irmãos, os príncipes Jorge e
Nicolas. Usando a influência da família real e recorrendo ao
sentimento de patriotismo helênico, o comitê lançou mão com
sucesso das associações e dos cidadãos gregos espalhados pelo
mundo para conseguir polpudas doações. Os organizadores também
sugeriram ao governo que emitisse uma série especial de selos e
medalhas comemorativas aos Jogos, com a verba revertida para o
evento. Tudo isso, somado à mais do que generosa ajuda do magnata
George Averoff que representou quase metade do total arrecadado ,
possibilitou às autoridades locais a construção da infra-estrutura
para a acomodação das dez modalidades esportivas previstas no
programa dos Jogos Olímpicos: atletismo, ciclismo, esgrima,
ginástica, tiro, natação, tênis, levantamento de peso e remo
(essa última modalidade, entretanto, acabou não sendo disputada
devido ao mau tempo). Além da reforma total do estádio
Panathinaiko, centro pulsante das competições, foram erguidos o
Velódromo de Neo Phaliro, um estande de tiro em Kallitheia e quadras
de tênis, entre outras instalações.
Espírito
olímpico
Connoly: o primeiro campeão olímpico. |
"Vida
longa à nação. Vida longa à Grécia!" O rei Jorge declarou
abertos os Jogos Olímpicos no dia 6 de abril no calendário
juliano, 25 de março, data em que se comemorava o 75º aniversário
da independência da Grécia , em uma concorrida cerimônia no
Panathinaiko. Diversas filarmônicas marcaram presença, e
reuniram-se para executar o Hino Olímpico, de autoria dos gregos
Palamas e Samaras, que evocava o espírito imortal da Antiguidade.
Bem ensaiado, o público formou um coro de 70.000 vozes, em um
espetáculo tocante. Em seguida, já se iniciaram as provas de
atletismo as três baterias eliminatórias dos 100 metros,
classificatórias para a final do dia seguinte, constituíram o
primeiro programa. Na seqüência, foi a vez do salto triplo, com dez
competidores, em que se coroou o primeiro campeão olímpico: o
americano James Connolly, com um pulo de nada menos que 2,70 metros.
A bandeira dos Estados Unidos foi colocada no centro da arena pelos
homens da Marinha Real e aplaudida com entusiasmo pelos gregos, em
uma generosa demonstração de reconhecimento e admiração pelo
desempenho do vencedor, cuja rota até Atenas incluiu uma viagem
transatlântica em um navio de carga.
A prova de natação, no mar Mediterrâneo: uma contenda muito equilibrada |
Esse
cavalheirismo, aliás, foi uma constante no comportamento dos
anfitriões, em todas as modalidades. Aproximadamente 240 atletas, de
14 diferentes nacionalidades, participaram dos Jogos Olímpicos. Mas
os helênicos, apesar de torcerem apaixonadamente pelos heróis
nacionais, congratulavam a todos como se fossem patrícios o que
despertou até a curiosidade de alguns competidores estrangeiros. "Eu
não teria conseguido cumprimentar meu oponente se ele tivesse me
superado em minha casa, como fez um atleta grego comigo",
declarou um desportista americano. "Mas foi uma coisa muito
bonita de se fazer." Durante todos os dias do evento, a
população de Atenas se juntou aos estrangeiros nas ruas da cidade
em fraternais demonstrações de integração. Todavia, a maior festa
dos oito dias de disputa aconteceu durante a chegada da maratona, em
que milhares de gregos viveram uma catarse coletiva com a vitória de
Spiridon Louis . Houve boas disputas também no atletismo (dominado
pelos desportistas dos Estados Unidos), na ginástica (modalidade em
que os alemães foram soberanos), na esgrima e na natação, em que
as nações estiveram mais equilibradas.
Fora
do programa
Spiridon na premiação: triunfos helênicos. |
Toda
a premiação dos campeões ocorreu no último dia dos Jogos
Olímpicos, em cerimônia presidida também pelo rei Jorge, com
diversos convidados internacionais. Cada vencedor recebia, pelo seu
feito, uma medalha de prata, um diploma e uma coroa de ramos de
oliveira; ao segundo lugar era oferecida uma medalha de bronze.
Depois da entrega dos lauréis, o atleta mais festejado do dia, o
grego Spiridon Louis, deixou seu posto para dar uma volta no estádio
seguido nesse desfile improvisado por todos os outros atletas.
Passado e presente voltavam a se unir depois de um hiato de 1.500
anos, enchendo de orgulho os gregos. O Barão de Coubertin celebrava.
"Alcançamos nestes Jogos uma grande inovação, que foi a
cooperação entre os povos e os esportes. É um enorme passo à
frente, que lança as bases para um novo futuro."
O
próximo encontro, de acordo com o plano quadrienal do Comitê
Olímpico Internacional, acontecerá em Paris, em 1900. Mas o sucesso
dos Jogos de Atenas pode trazer uma pequena dor de cabeça a
Coubertin, que assumirá como presidente do comitê organizador do
evento em solo gaulês. Em seu discurso de encerramento, o rei Jorge,
empolgado com o efeito contagiante do evento sobre o moral da
população, lançou uma frase que certamente não estava no programa
dos homens do Comitê Olímpico. "Que a Grécia esteja destinada
a ser o ponto de encontro pacífico de todas as nacionalidades, e que
Atenas se torne a sede permanente dos Jogos Olímpicos." A sorte
está lançada.
O
prêmio aos vencedores
Para
o Barão de Coubertin, idealizador da retomada dos Jogos Olímpicos,
o importante não é vencer, mas simplesmente competir. Os atletas
que triunfaram nas competições de Atenas, contudo, voltaram para
casa com algo mais que a satisfação de conquistar uma vitória:
foram presenteados com belíssimas medalhas. Os primeiros colocados
ganharam medalhas de prata. Os que ficaram em segundo lugar receberam
medalhas de bronze. No quadro abaixo, os países que somaram mais
medalhas.
|
País
|
Prata
|
Bronze
|
1
|
Estados Unidos
|
11
|
7
|
2
|
Grécia
|
10
|
17
|
3
|
Alemanha
|
6
|
5
|
4
|
França
|
5
|
4
|
5
|
Grã-Bretanha
|
2
|
3
|
6
|
Hungria
|
2
|
1
|
7
|
Áustria
|
2
|
1
|
8
|
Austrália
|
2
|
0
|
9
|
Dinamarca
|
1
|
2
|
10
|
Suiça
|
1
|
2
|
11
|
Países mistos
|
1
|
1
|
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