Acordo de Kigali, contra efeito estufa, põe Paris no chinelo
Acordo de Kigali contra efeito estufa põe Paris no chinelo
A
emenda ao Protocolo de Montréal (1987) com que mais de 170 países
concordaram
no sábado em Kigali(Ruanda),
com vistas a eliminar o uso de certos gases de refrigeração (HFCs),
vem sendo qualificada como a mais poderosa medida para conter o
aquecimento global e a mudança do clima.
É
verdade. O acordo tem quase tudo que falta ao de Paris,
obtido em dezembro passado por 195 nações: metas quantitativas
nacionais que podem ser monitoradas, prazos definidos, sanções para
descumpridores e equidade entre as partes.
A
emenda pretende reverter um efeito colateral do protocolo de 1987.
Considerado
o mais bem-sucedido tratado ambiental, Montréal logrou banir da
indústria gases que produziam o buraco de ozônio na atmosfera
(CFCs). Mas ele abriu as portas para os HFCs, pelo menos um milhar de
vezes mais danosos para o clima que o gás carbônico (CO2) emitidos
na queima de combustíveis fósseis.
Fumaça
cobre região do aeroporto de Nova Déli, na Índia; país é o
terceiro maior
emissor de poluentes .
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Esse
enorme potencial para reter radiação solar na atmosfera e
esquentá-la tornou os HFCs o galho mais baixo e fácil de podar na
frondosa árvore do aquecimento global.
O
objetivo inicial dos negociadores na vanguarda, EUA em sua liderança,
era sacramentar na lei internacional um congelamento generalizado no
emprego desses gases em 2021. Depois, todos teriam de reduzi-los, até
2046, a 15% dos níveis de 2012.
Com
isso, calcula-se que 0,5ºC de aquecimento seria evitado. Já
bastaria para cumprir um terço da meta mais ambiciosa —porém
apenas indicativa, não mandatória— de Paris (1,5ºC). A emenda de
Kigali não chega lá, mas chega perto.
Para
acomodar os interesses dos países mais pobres, os negociadores
aceitaram metas e prazos diferenciados para três grupos de países.
Os mais ricos, como EUA e Europa, têm de 2018 a 2036 para cumprir
seu objetivo. China, Brasil e vários países africanos, de 2024 a
2045.
Nações
mais afligidas pelo calor, como Índia (onde se registraram em maio
temperaturas acima de 47ºC) contam com prazo ainda mais relaxado, de
2028 a 2047. Anos-base e percentuais de corte também variam, a favor
dos mais pobres.
ONGs
ambientais saudaram o acordo como grande avanço. Esse tratamento
mais equânime, como sempre defendem, não chega a desfigurar a meta
numérica, que estaria 90% garantida. Ou seja, em lugar de 0,5ºC, o
aquecimento evitado seria da ordem de 0,45ºC. Nada mau.
Além
disso, Kigali apenas emenda uma legislação em vigor (o Protocolo de
Montréal). Não carece de mais tratativas para pôr sanções em
prática, como sanções comerciais.
Por
fim, pinçar uma única classe de substâncias em um só ramo
industrial (refrigeração) é operação mais fácil do que estancar
o CO2. Este se produz em redes circulatórias vitais para países e
regiões inteiros —transportes, petróleo, carvão,
termoeletricidade, desmatamento, pecuária etc.
Daí
se origina a força de Kigali e a fraqueza de Paris.
De
todo modo, é uma façanha obter aquele acordo com apoio de países
que só neste século 21 ganham acesso ao conforto do
ar-condicionado. Neles deverá vender-se 1,6 bilhão de aparelhos até
meados do século, a maioria ainda com a tecnologia que ora se busca
banir. Precisam de mais tempo par adaptar-se.
Por
outro lado, surge aí uma excelente oportunidade de negócios para
países desenvolvidos, cuja indústria conta com o capital e os meios
técnicos para fazer essa transição mais rapidamente e fornecer
alternativas aos HFCs.
Há
razão para algum otimismo, portanto, mas guardado. O empenho
diplomático do governo Barack Obama em deixar sua marca na questão
do clima tem os dias contados, e sua continuidade não está
garantida nem em caso de vitória da também democrata Hillary
Clinton na eleição presidencial norte-americana.
Sim,
o Acordo de Paris entrará em vigor antes do previsto, graças à
rápida ratificação por vários países. E, sim, eles se mostraram
capazes de negociar avanços razoáveis com os HFCs e sobre as
emissões no setor de aviação.
A
dúvida é se eles conseguirão aproveitar esse momento para alcançar
em tempo os galhos mais preocupantes na árvore ameaçada do
aquecimento global, antes que ela rua sob o próprio peso.
Matéria
na íntegra através do link:
http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/10/1823389-acordo-de-kigali-contra-efeito-estufa-poe-paris-no-chinelo.shtml?cmpid=twfolha
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