Vice de conselho de direitos humanos está preso sob suspeita de elo com Facção

Vice de conselho de direitos humanos é preso sob suspeita de elo com facção

    Luiz Carlos dos Santos, do Condepe, preso em operação da Polícia Civil e 
Ministério Público de SP.  

Ao menos 35 pessoas foram detidas nesta terça-feira (22) durante uma operação da Polícia Civil e do Ministério Público de São Paulo contra o crime organizado. Elas são suspeitas de ligação com 14 lideranças da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) que estão em presídios paulistas.
A prisão mais exaltada pela polícia foi a do vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Luiz Carlos dos Santos, o único com ordem de prisão que não pertence aos quadros da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
Dos alvos de ordem de prisão temporária de cinco dias estão 32 que, segundo a investigação, atendiam as lideranças da facção. "São advogados que atuavam não na defesa técnica, mas com direito constituído para terem contato com 14 lideranças da facção criminosa", disse o secretário da Segurança da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), Mágino Alves Barbosa Filho.
A polícia diz que Santos fazia "falsas denúncias" perante organismos de proteção dos direitos humanos com o objetivo de "desestabilizar a segurança pública do Estado". A defesa dele diz que a prisão pode ser uma retaliação devido às ações de combate à violência policial. Em nota, o Condepe afirmou que ele tinha trajetória contundente na área e disse que computador e documentos apreendidos guardam informações sigilosas de testemunhas de violação dos direitos humanos.
"Há indícios fortes de sua participação criminosa. Esse senhor recebia uma mesada da organização criminosa, algo em torno de R$ 5.000, porque se calcula que tenha recebido algo em torno de R$ 130 mil da organização", disse o secretário.
A investigação aponta que houve um pagamento inicial de R$ 130 mil, além de "mesada" de R$ 5.000 mensais –depósitos que eram feitos na conta do conselheiro e da mulher dele.
A investigação também indica que o conselheiro pode ter recebido R$ 12 mil em sua campanha para reeleição do conselho, que ocorreu neste ano.
"Dentro de sua atuação no Condepe, ele gerava alguma notícia que faziam com que as pessoas acreditassem que organismos policiais estivessem agindo de determinada forma violenta, em perseguição a determinados grupos", disse Barbosa Filho. "É óbvio que, se você tem uma organização criminosa, você planta notícia que abala a imagem das instituições policiais, óbvio que isso favorece a organização criminosa."
A polícia diz que a investigação durou cerca de um ano e meio e teve início após a apreensão de documentos com integrantes da facção.
Além deste documento, o secretário disse que interceptações telefônicas e quebra de sigilo bancário, feitas com autorização da Justiça, reforçam as suspeitas contra Santos.
A defesa de Santos informou que seu cliente nega todas as acusações.
Barbosa Filho não soube apontar, porém, nenhuma notícia comprovadamente falsa que pudesse ter sido divulgada pelo conselheiro.
Ele chegou a mencionar a chacina de cinco jovens da zona leste da capital por um grupo supostamente liderado por um guarda municipal de Santo André. Mas depois afirmou que esse seria apenas um caso provável. "Não posso dizer se é ou não é", disse.
O secretário diz que Santos queria envolver a PM indevidamente no crime, com insinuações de que policiais estariam rondando a casa de uma das vítimas.
Advogados são presos por suspeita de ajudar facção em São Paulo 

A operação, batizada de Ethos, teve como objetivo desarticular a célula criminosa do PCC, denominada de "R", composta por 40 advogados, sob controle de presos vinculados à organização. A polícia cumpre 41 mandados de prisão, sendo 40 contra advogados, além de 65 de buscas e apreensão.
O ex-presidente do Condepe Rildo Maques de Oliveira disse que não teve detalhes do inquérito, mas defende uma punição exemplar caso as acusações contra Santos sejam comprovadas –até porque há um desgaste para todas as entidades ligadas aos direitos humanos.
"Se tiver procedência, de algum envolvimento dele, que seja com o crime organizado ou situação parecida, é muito grave para o próprio conselho. Tudo isso cria descredibilidade com os poderes públicos e também das pessoas que confiam no conselho".
Ele ressalta, porém, que Santos tem um histórico de combate à violência policial na Grande SP, incluindo contra grupos de extermínio. Diz ainda que faz anos que autoridades paulistas fazem falsas acusações contra membros do Condepe, de ligação com o crime por conta do trabalho de defesa dos direitos dos presos.
O vice-presidente da ONG Conectas Direitos Humanos, Marcos Fuchs, disse considerar a prisão de Santos uma "ameaça" ao setor. "Não é saudável para a nossa causa. Não é saudável para quem defende direitos humanos, para todas as entidades e para todas as organizações", afirmou.
"O Condepe é um órgão seríssimo, que tem esse papel, esse condão na defesa de direitos humanos, de receber denúncias, de apurar denúncias, de fazer inspeções e fazer visitas no sistema prisional como uma das suas prerrogativas", disse Fuchs. "Precisamos ter muita cautela", ressalvou.
Barbosa Filho disse ainda que, embora tenha ocorrido uma operação na sede do Condepe, nenhum outro conselheiro do órgão é suspeito de envolvimento com a facção criminosa. "Neste momento, não há notícia da participação de nenhum outro conselheiro nesse tipo de conduta delituosa", disse. "O Condepe é um órgão sério. Não tenho dúvida disso. A gente tem lá inúmero conselheiros vocacionados na defesa dos direitos humanos. Pessoas de reputação ilibada. Não tenho dúvidas disso."
Sobre a apreensão de computadores apreendidos na sede do conselho, isso ocorreu porque eram de uso de Santos. "Pode ser até do Condepe, mas de uso do conselheiro Luiz Carlos [Santos]. [...] Esse material apreendido hoje será tratado com o sigilo necessário".
A polícia não divulgou o nome dos outros suspeitos. Disse que a maioria trabalhava como "pombo correio" dos presos do PCC para transmissão de ordens, incluindo criminosas.
INVESTIGAÇÃO
A investigação teve inicio há um ano e meio e identificou 55 pessoas, das quais 41 estavam em liberdade e contribuíam para a prática criminosa vinculada à organização. Os demais investigados são presos que estão no sistema penitenciário paulista –considerados líderes da facção. A investigação também teve o apoio do Ministério Público.
Em nota, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) afirma que "tão logo tomou conhecimento das diligências, nas primeiras horas do dia, determinou o acompanhamento por meio de sua Comissão de Direitos e Prerrogativas Profissionais, para assegurar o respeito aos direitos dos profissionais".
Afirma também que, na medida em que tiver ciência das acusações aos advogados, assegurado o direito de defesa, promoverá as apurações necessárias.
A operação, conduzida pelo Deinter-8 (Departamento de Polícia Judiciário do Interior), foi feita em ao menos dez municípios no Estado de São Paulo, entre eles, a capital paulista, Cotia, Santos e Presidente Prudente. Ao todo, 703 policiais civis e membros do Ministério Publico participaram.
Segundo policiais ouvidos pela Folha, os presos nesta terça (22) são suspeitos de participar de lavagem de dinheiro para o crime, de serem intermediários na comunicação entre os membros da facção presos e os que estão soltos e de fazerem dossiês de agentes públicos.
O Condepe é ligado à Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania do governo Geraldo Alckmin (PSDB). A pasta informou que, apesar de ser ligado à secretaria, o conselho é um órgão independente e tem autonomia. Por isso, não faria nenhum comentário sobre a prisão de Santos. A Folha entrou em contato com o Condepe, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo informou que o secretário Mágino Alves Barbosa Filho dará uma entrevista na tarde desta terça para falar sobre a operação de combate ao crime organizado. O subprocurador-geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais do MP de São Paulo, Mário Sarrubbo, também participará.
CONDEPE
Criado em 1991, o Condepe está previsto na Constituição Estadual de SP de 1989. No artigo 110, o texto diz que o conselho tem como finalidade "investigar as violações de direitos humanos no território do Estado, de encaminhar as denúncias a quem de direito e de propor soluções gerais a esses problemas".
O Condepe tem como prerrogativas acessar unidades prisionais, requisitar informações, documentos ou processos de órgãos públicos estaduais e propor sindicâncias e inquéritos para apuração de violações de direitos, entre outras.
OUTRO LADO
"[Santos demonstrou] muita preocupação, demonstrou que talvez seja uma retaliação ao nome dele, em relação às ações que ele faz por aí com relação aos direitos humanos, as abordagens policiais", disse, à Folha, o advogado Carlos Alberto Miramontes.
"Todas as situações, visitas que ele faz em presídios, como faz parte do Condepe, são visitas monitoradas. Com pessoal da SAP, com a diretoria do presídio, com todo mundo. 'Eu nunca vou sozinho falar com ninguém, mesmo porque nem sou advogado. Sou representante dos direitos humanos', ele disse", afirmou Miramontes.

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