Brasil é despejado de consórcio internacional de astronomia
Brasil é despejado de consórcio internacional de astronomia
Observatório Europeu do Sul (ESO) rescindiu contrato assinado em 2010 para que o Brasil se tornasse membro do grupo, garantindo acesso de astrônomos brasileiros a alguns do melhores telescópios do mundo e participação do país na construção do Extremely Large Telescope, o maior telescópio de todos os tempos
O
Observatório Europeu do Sul (ESO),
maior consórcio de pesquisa astronômica do mundo, finalmente se
cansou de esperar pelo Brasil. Sete anos depois de assinar um acordo
para admitir o país como primeiro integrante não-europeu do grupo,
o Conselho do ESO decidiu rescindir o contrato com o governo
brasileiro — que, nesse meio tempo, nunca fez qualquer pagamento
nem chegou a ratificar em definitivo o acordo.
“Considerando
ser improvável que a ratificação do Acordo de Acesso seja
concluída num futuro próximo, o Conselho do ESO decidiu suspender o
processo até que o Brasil esteja numa posição de completar a
execução do Acordo, possivelmente por meio de uma renegociação”,
diz uma “nota
de esclarecimento” divulgada pelo ESO hoje. “Com apoio
unânime de todos os Estados Membros, o ESO continuará aberto a
acolher o Brasil a qualquer momento. Os arranjos vigentes, porém,
estarão suspensos a partir de 1 de abril de 2018.”
A
entrada do Brasil para o ESO foi negociada no fim de 2010 pelo então
ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, como uma forma de
garantir o acesso da comunidade científica brasileira a alguns dos
maiores e melhores telescópios do mundo, que são operados pelo
consórcio europeu nos Andes Chilenos — como o ALMA
e o Observatório Paranal.
O acordo também previa a participação do Brasil na construção e
operação do Extremely
Large Telescope (ELT), o maior telescópio do mundo, que está
sendo construído agora no Deserto do Atacama.
O
valor do acordo era de EU$ 270 milhões (cerca de R$ 1 bilhão), que
o Brasil deveria pagar em várias parcelas até 2021. Nenhum centavo
foi pago, apesar de o ESO, numa demonstração de boa-fé, ter
tratado o Brasil como uma espécie de membro interino durante esse
período. Mesmo sem a ratificação definitiva do acordo, os projetos
de astrônomos brasileiros eram avaliados pelo grupo — para fins de
obtenção de tempo de observação nos telescópios — como se o
Brasil fosse um estado membro do consórcio, o que oferecia uma série
de vantagens competitivas. Agora, com a rescisão do contrato, os
cientistas brasileiros que quiserem usar os observatórios do ESO
terão de concorrer por tempo como representantes de um país não
membro, o que implica numa disponibilidade tempo muito menor e
critérios muito mais rígidos de seleção.
“A
gente perde muita coisa. O acesso aos telescópios fica bem mais
complicado, o que é lamentável”, disse ao Estado
o
astrônomo Gustavo Rojas, professor da Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar) e representante de Divulgação Científica do ESO no
Brasil. Segundo ele, a exclusão vai dificultar o avanço da
astronomia brasileira. “O Brasil nunca vai conseguir construir uma
infraestrutura de pesquisa desse porte sozinho; ou a gente se junta a
esses grandes consórcios internacionais ou vamos ficar para trás.”
Uma
das principais críticas feitas ao acordo era de que ele era caro
demais. Rojas lembra, porém, que ele teria custado menos do que
alguns estádios da Copa do Mundo, com um alto retorno em
desenvolvimento científico e tecnológico de longo prazo para o
país. Só a reforma do Maracanã, por exemplo, custou mais de R$ 1,2
bilhão. “É lamentável a falta de interesse dos governantes por
um projeto de ciência e tecnologia para o país”, diz. “Vamos
tentar reverter isso de alguma forma mais para frente.”
Procurado
pela reportagem hoje à tarde, o Ministério da Ciência, Tecnologia,
Inovações e Comunicações (MCTIC) emitiu a seguinte nota: “O
MCTIC defende a participação do Brasil no Observatório Europeu do
Sul e faz gestões junto ao Governo Federal pela confirmação da
adesão a esta entidade multilateral.” Numa conversa recente sobre
o assunto, o secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação
do MCTIC disse que o ministério era favorável à adesão do Brasil
ao ESO, mas infelizmente faltam recursos orçamentários para
implementar o acordo.
O
contrato chegou a ser aprovado pelo Congresso em maio de 2015, no
primeiro ano do segundo mandato de Dilma Rousseff, mas desde então
faltava ainda uma assinatura presidencial
para concluir o processo de ratificação.
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