Câmera inspirada em olho de borboleta pode tornar cirurgia de câncer mais eficaz
Câmera inspirada em olho de borboleta pode tornar cirurgia de câncer mais eficaz
Cientistas americanos reproduziram no dispositivo estruturas do sistema visual do inseto, que enxerga a luz visível e infravermelha ao mesmo tempo; integrada a óculos, câmera permite que cirurgião veja tecidos tumorais com fluorescência
O
complexo funcionamento dos olhos de um gênero de borboleta foi a
inspiração para que cientistas americanos desenvolvessem uma nova
câmera capaz tornar as cirurgias de câncer mais eficazes e rápidas.
A
inovação, descrita em artigo publicado nesta quinta-feira, 5, na
revista científica Optica,
permite ao cirurgião diferenciar com precisão as células
cancerosas das normais, evitando tanto os danos aos tecidos saudáveis
como as remoções incompletas dos tumores.
A
pequena câmera funciona conectada a óculos especiais que são
utilizados pelo cirurgião durante o procedimento. Pelo dispositivo,
o cirurgião consegue enxergar os sinais infravermelhos - que
normalmente são invisíveis - emitidos pelas células de câncer
quando elas são "rotuladas" com fluorescência.
Os olhos das borboletas do gênero Morpho foram a inspiração para a câmera cirúrgica. |
De
acordo com os autores do estudo, da Universidade de Illinois em
Urbana-Champaign e da Universidade de Washington em St. Louis - ambas
dos Estados Unidos - o olho da borboleta possui nanoestruturas
sensíveis à informação multiespectral - isto é, o animal
consegue captar não apenas as imagens coloridas produzidas pela luz
visível, mas também imagens fluorescentes em espectro próximo ao
infravermelho.
"Observando
a maneira como a natureza desenhou o sistema visual dos insetos,
podemos trabalhar para solucionar problemas sérios que existem hoje
na cirurgia de câncer e, assim, ter certeza de que nenhuma célula
de câncer foi deixada de lado durante a cirurgia", afirmou o
coordenador da pesquisa, Viktor Gruev, da Escola de Medicina da
Universidade de Illinois.
"Essa
tecnologia é mais sensível, mais precisa, muito mais compacta e
mais barata que os instrumentos atualmente disponíveis que foram
aprovados pela FDA (a agência reguladora de medicamentos e alimentos
dos Estados Unidos) para detectar esses sinais", afirmou Gruev.
Os cientistas testaram a nova câmera cirúrgica em pacientes com câncer de mama, removendo nódulos linfáticos, que são os primeiros pontos onde esse tipo de tumor se espalha. |
Baixo
custo. Segundo Gruev, muitos cirurgiões
dependem da visão e do tato pare encontrar os tecidos tumorais
durante as cirurgias. Grandes hospitais ou centros especializados de
tratamento do câncer também utilizam agentes fluorescentes próximos
do infravermelho, que se acumulam nos tumores, de forma que os
médicos possam distingui-los em dispositivos específicos.
No
entanto, esses equipamentos são extremamente caros, o que limita sua
utilização em hospitais menores, além de serem muito grandes, o
que dificulta sua integração nos locais de cirurgia. Mas o
principal problema é que sua utilização exige a iluminação seja
reduzida para que os instrumentos possam captar o fraco sinal
fluorescente, o que prejudica a visão dos cirurgiões durante o
procedimento.
"Cerca
de 95% dos hospitais nos Estados Unidos têm salas de cirurgia
pequenas. Não importa o quanto a tecnologia seja boa, se os
dispositivos forem muito grandes eles simplesmente não cabem no
local de cirurgia", afirmou o autor principal do artigo, Missael
Garcia, também da Universidade de Illinois.
Para
desenvolver o novo instrumento, os cientistas se basearam no
funcionamento das borboletas do gênero Morpho, que é bastante comum
no Brasil e geralmente é reconhecida pelas suas asas com bordas
pretas e um azul vivo no centro.
Os
pesquisadores construíram a nova câmera com o mesmo tipo de
nanoestruturas especializadas que são encontradas no olho das
borboleta Morpho, que as tornam capazes de enxergar imagens
multiespectrais. Como a câmera registra simultaneamente as imagens
coloridas comuns e os sinais infravermelhos, não é preciso reduzir
as luzes da sala de cirurgia.
"Os
óculos que são integrados à nossa câmera com tecnologia
'bioinspirada' protegem os olhos do cirurgião e, ao mesmo tempo,
projetam a informação fluorescente quando o médico quiser. Os
óculos têm custo incrivelmente baixo. Estimamos que custará cerca
de US$ 200, enquanto o instrumento mais barato aprovado pela FDA
custa US$ 20 mil", disse Gruev.
O pós-doutorando Missael Garcia (esquerda) e o professor Viktor Gruev lidera- ram a equipe da Universidade de Illinois que desenvolveu uma câmera multies- pectral para facilitar cirurgias de câncer. |
Testes.
Em colaboração com os cientistas da
Universidade de Washington, o grupo liderado por Gruev testou a
câmera em camundongos e em humanos. A câmera foi capaz de encontrar
tumores de mama em camundongos, utilizando um marcador fluorescente
próximo ao infravermelho, que tinge especificamente as células do
tipo de câncer que o animal apresentava.
Como
a câmera enxerga para além da luz visível e consegue captar sinais
que estão sob a superfície do tecido, os cirurgiões podem até
mesmo localizar tumores através da pele. "Podemos captar as
imagens antes de fazer a incisão, identificando assim os potenciais
pontos de interesse a fim de reduzir a incisão", disse Garcia.
A
câmera também foi testada para a localização de nódulos
linfáticos em pacientes humanos com câncer de mama. "Os
médicos precisam remover todos os nódulos linfáticos no entorno um
tumor para ver se o câncer se espalhou. Para enxergar melhor os
nódulos, os cirurgiões costumam marcá-los", disse Gruev.
No
experimento, os cirurgiões empregaram um marcador verde fluorescente
de utilização comum em cirurgias, que também emite um sinal
invisível no espectro infravermelho.
Os
cientistas compararam a eficácia dos médicos na identificação dos
nódulos linfáticos em um paciente com câncer de mama quando eles
procuravam os tecidos marcados em verde olhando diretamente para o
local da operação, e quando eles os procuravam utilizando a "câmera
de olho de borboleta".
"Nossa
tecnologia é muito mais rápida, porque uma das suas vantagens é
produzir imagens mais profundas do tecido. Às vezes, quando eles (os
médicos) procuram por tecidos coloridos em verde, é preciso
observar por certo tempo, porque os nódulos estão sob a superfície.
Com a fluorescência, eles podem olhar através da pele ou do tecido,
identificando os nódulos muito mais rapidamente", explicou
Gruev.
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